Promessas constantes em todas as campanhas eleitorais e apresentadas como a solução para boa parte dos problemas recentes do país, a reforma política que pode alterar o funcionamento dos partidos segue como tema controverso entre os parlamentares e dificilmente sairão do papel ainda este ano. Na última semana, senadores aprovaram, em primeiro turno, uma proposta que reduz o número de legendas e veta a criação de novas siglas. A votação em segundo turno no Senado está marcada para o dia 23, quando deve ser aprovada e encaminhada à Câmara. Na Casa dos deputados, porém, onde a presença de legendas consideradas nanicas é mais forte, a PEC deve ser drasticamente alterada, correndo o risco de ser enterrada.
Apesar da polêmica, especialistas ressaltam a necessidade de mudanças que diminuam a quantidade de siglas no Brasil. A PEC aprovada, de autoria dos senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e Ricardo Ferraço (PSDB-ES), acaba com as coligações proporcionais – que seriam permitidas somente até as eleições municipais de 2020 – e estabelece uma cláusula de barreira, que coloca o índice mínimo de 2% votos a serem obtidos nacionalmente em 14 estados, nas eleições de 2018, para garantir o funcionamento de partidos.
O projeto impacta diretamente o funcionamento de legendas pequenas e nanicas, como os ideológicos Psol, PCdoB, Rede e outros, como PHS. Hoje, há 32 partidos no país, dos quais 28 têm representação na Câmara dos Deputados. Cerca de 15 deles poderiam ser afetados. Há ainda mais de 20 partidos em processo de criação no Tribunal Superior Eleitoral. Por isso, esses partidos costuram um acordo na Câmara para alterar a proporção para 1,5% dos votos em cinco estados – com um aumento gradual nesse percentual.
O PT deve apoiar essa proposta, já que parte dessas legendas ideológicas votou contra o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Apesar da resistência, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em acordo com o comandante do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pautar a matéria. Integrante da Comissão da Reforma Política na Câmara, o deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF) critica a proposta que deve ser aprovada em segundo turno no Senado.
“O sentimento que tenho é que vai ser engavetado quando chegar aqui. A reforma tem que iniciar na Câmara, que representa o povo. O acordo é para passar menos de 2%. Não deve se ter essa pressa toda. Ninguém está desesperado. O assunto mais importante no momento é a Lava-Jato”, diz. O partido de Fonseca é um dos que seria diretamente afetado pela mudança. O Pros tem seis deputados.O relatório sobre a reforma na Câmara só deverá ficar pronto em maio do ano que vem.
Transição
O líder do PTB, Jovair Arantes (GO), afirma que não há consenso em torno da matéria. E afirma que o Senado não deveria ser o responsável pelo pontapé inicial da reforma. “O Senado está votando algo que não diz respeito a eles. A Câmara representa o povo e vamos discutir com muita tranquilidade. Eu acredito que deve haver uma transição. Pode ser um índice de 1,5% em cinco estados e vai aumentando. Mas não pode ser 2% em 14 estados”, afirma. Durante a votação da proposta em primeiro turno, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou uma emenda para reduzir o índice de 2%, mas foi derrotado.
O líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (SE), defende a aprovação das medidas na Câmara como estão. “As consequências do atual sistema é que você não têm partidos com densidade, partidos com consistência. A maior democracia do mundo tem dois partidos políticos”, citou.
Professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Carlos Ranulfo Melo avalia como essencial a aprovação de uma cláusula de desempenho. “Mesmo que se aprove uma cláusula de 1,5% e suba progressivamente, o melhor é avançar nesse sentido. Se aprovasse, já faria uma certa limpa e inibiria o surgimento de mais partidos”, opina. Ranulfo pondera um outro problema de a PEC do Senado ser analisada agora: o tema ser confundido com as eleições para a presidência da Câmara. “Os deputados vão começar a fazer campanha. Você tem que separar as coisas”, disse.
Professor da Universidade de Brasília (UnB), o cientista político João Paulo Peixoto não só diz que já passou da hora de a clásula ser aprovada, como avalia o índice mínimo de 2% dos votos em 14 estados como baixo. “Acho que 2% ainda é pouco e vem com atraso. Os partidos pequenos têm que desaparecer. Ou se legitimam ou desaparecem, porque funcionam como partidos de aluguel”, diz. Peixoto faz uma ponderação quanto a legendas ideológicas, como PCdoB e Psol, e diz acreditar que elas se salvem com o índice mínimo estabelecido. “O PCdoB tem tradição, mas também precisa se legitimar”, avalia.
Propostas para a reforma
Fim das coligações proporcionais
As coligações são alianças formadas entre os partidos à época das eleições e que podem aumentar o tempo disponível em propagandas de rádio e tevê, por exemplo. No caso dos pleitos proporcionais, nos quais são eleitos vereadores, deputados federais, estaduais e distritais (no caso do DF), a quantidade de votos obtidos pela coligação influencia no número de candidatos que, de fato, vão assumir os postos. Um candidato muito bem votado, com o número de apoios superior ao quociente eleitoral, mas que faça parte de uma coligação com desempenho inferior, pode ficar de fora do parlamento pelos critérios da proporcionalidade.
Cláusula de Barreira ou de Desempenho
Estabelece normas para o funcionamento dos partidos, para que tenham acesso ao fundo partidário e tempo de rádio e tevê, por exemplo. Segundo a proposta aprovada semana passada no Senado, a partir das eleições de 2018, as legendas só poderão funcionar se tiverem adquirido 2% da média dos votos válidos nacionalmente, e 2% em pelo menos 14 unidades da federação – metade dos estados. A partir de 2022, o índice mínimo subirá para 3% dos votos válidos, com as mesmas regras. Parlamentares de partidos menores, derrotados no Senado, vão tentar, na Câmara dos que o índice seja de 1,5% do total dos votos em cinco estados, aumentando gradativamente.
Fundo Partidário
Dinheiro público destinado aos partido, adquirido por meio de doações, dotações orçamentárias da União, multas eleitorais, entre outras. O fundo é distribuído mensalmente entre as legendas. Do total, 5% são destinados igualmente a todos os partidos. Os outros 95% são distribuídos proporcionalmente, de acordo com os votos obtidos nas últimas eleições na Câmara dos Deputados, levando-se em conta, portanto, o tamanho das bancadas.
Fim da reeleição
Outra medida que deverá ser colocada em análise no Senado na próxima semana é umaoutra Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que acaba com a possibilidade de reeleição para postulantes a cargos no Executivo Federal. Dessa forma, governadores, prefeitos e o presidente da República não podem ser reeleitos. Parlamentares defendem que o mandato seja, então, aumentado para cinco anos, no lugar de quatro.
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