O perfil de três internautas que postaram nas redes sociais mensagens discriminatórias após a vitória da cearense Melissa Gurgel no concurso Miss Brasil, no último sábado (27), foram anexados à notícia-crime apresentada pela OAB-CE (Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Ceará) ao Ministério Público Federal. A denúncia foi feita na segunda-feira (29) para apurar a prática de crime de racismo, segundo informou ao R7 o presidente da Ordem, Ricardo Bacelar.
— O racismo não é só destinado à raça. A lei do racismo, no artigo 20 [da Lei n.º 7.716/89], amplia o conceito de racismo. Então, quando se coloca qualquer tipo de preconceito, de insinuações de cunho discriminatório para tentar diminuir, por em uma situação desigual ou tentar ofender determinado grupo, isto é considerado racismo e incitação ao racismo.
A pena para quem pratica o delito varia de um a três anos de prisão, além de multa. Se a infração for cometida com a utilização de meios de comunicação ou de internet — o que aumentaria o alcance da agressão —, a penalidade é agravada, variando de dois a cinco anos de prisão e multa.
Na avaliação de Bacelar, o povo do Ceará foi ofendido nas postagens. Caso o MPF acolha o pedido, as pessoas denunciadas serão julgadas pela Justiça e podem ser condenadas, como aconteceu com a estudante de direito Mayara Petruso. Em 2010, após a vitória da candidata Dilma Rousseff (PT), a universitária postou em redes sociais comentários depreciativos em relação aos nordestinos, deflagrando uma onda de preconceito na internet.
A exemplo do que aconteceu com a estudante de direito, o presidente da OAB-CE também espera punição para os envolvidos na ocorrência mais recente. Eles podem responder pelo crime de racismo ou incitação ao racismo.
— Espero que o Ministério Público tome as providências que requeremos na forma da lei. A materialidade [do crime] está muito clara. Houve indignação pública sobre isso. Hoje em dia, não se pode mais admitir esse tipo de discriminação. Temos que ser enérgicos e rápidos para dar uma resposta à altura.
Ricardo Bacelar enfatiza o orgulho que o povo cearense sente da própria identidade cultural.
— Nós, o povo do Ceará, temos orgulho da nossa identidade cultural, do nosso sotaque, da nossa maneira de ser. Não vamos admitir que ninguém nos desrespeite.
Melissa Gurgel foi a terceira representante do Ceará a conquistar a coroa de Miss Brasil na história do concurso. Antes dela, apenas Flávia Cavalcanti Rebêlo (em 1989) e Emília Barreto Correia Lima (em 1955) haviam faturado o posto de mulher mais bela do mundo.
A organizadora do Miss Ceará — que garante vaga no concurso nacional — lamentou o episódio. Valéria Mannarino destacou que esse tipo de discriminação.
— A gente fica muito triste. Muito chateada. As pessoas deveriam pensar mais antes de fazer as coisas.
Procurada, a Miss Brasil 2014 disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não vai comentar o episódio. No Instagram, no entanto, Melissa falou sobre o assunto com seus seguidores e pediu mais tolerância.
— Resolvi usar este espaço para me posicionar sobre esse assunto tão triste que é o preconceito, seja do que for: religião, cor, estado de origem, orientação sexual… O Brasil é um país com tanta diversidade de povos e culturas. Cada região tem a sua peculiaridade, seja no clima, na cultura ou no sotaque. E nós precisamos saber conviver com todas elas, admirá-las e respeitá-las. Só assim seremos reconhecidos lá fora como uma nação unida que preza pelos seus.
A 60ª edição do concurso foi realizada em Fortaleza, no Centro de Eventos do Ceará, no último sábado (27). Na aparição de Melissa Gurgel no palco, o público, de 2.500 pessoas, vibrava em apoio à candidata local.
Melissa Gurgel era uma das mais baixinhas entre as 27 candidatas. Com 1,68 m, a Miss tem a altura mínima para participar da disputa. A cearense, no entanto, foi uma gigante no evento e se destacou como a mais preparada desde o início da competição.
A segunda colocada foi Fernanda Leme, de São Paulo, seguida por Deise Benício, do Rio Grande do Norte.
Melissa Gurgel vai representar o Brasil no Miss Universo, que será realizado nos Estados Unidos, ainda sem data definida.