Vivemos um momento em que os movimentos sociais estão em cheque, demonizados, estigmatizados, incompreendidos, manipulados. Desde as manifestações de 2013 há um bombardeio constante da mídia conservadora a qualquer movimento popular contestador. Com exceção dos panelaços paulistas contra o PT, tudo é visto como terrorismo.
O resultado disso é violência. E justificada institucionalmente. O cúmulo é a frequência de imagens nas tevês e redes sociais de policiais treinados, equipados e armados dando rasteiras em adolescentes, professores, sem-tetos e sem-terras por aí. Se reunir para contestar e protestar voltou a ser uma atividade “subversiva”, como eram as reuniões sindicais e estudantis, na década de 1970, quando os discursos eram aplaudidos com o estalar de polegares e médios, para que o barulho das palmas não chamasse a atenção da “repressão”.
Vemos grupos invadindo a Congresso e pedindo intervenção militar. De onde vem esse pensamento obtuso e equivocado? Vem do processo incompleto da saída da ditadura militar e do processo incompleto da redemocratização, quando um sem-número de crimes ocorridos nesse ínterim foi varrido para baixo do tapete deixando as pessoas alienadas do real significado da ruptura institucional por que o país passou.
Em entrevista esta semana o ex-ministro de estado e professor da Universidade de Harvard, o brasileiro Roberto Mangabeira Unger fez afirmações de uma simplicidade jornalística e de uma verdade incontestável a respeito da ressignificação da cidadania no Brasil e no mundo. Reproduzo a parte que ele fala do trabalho e da representação de classe; diz Mangabeira que “Temos no Brasil 40% da população brasileira na economia informal. Na economia formal, uma parte crescente dos trabalhadores está em situação de trabalho precarizado. Se você somar os informais e os precarizados, é a maioria da força de trabalho do país. Quem os representa? Qual é o projeto para organizar, proteger e qualificar essa maioria? A esquerda tradicional não faz isso. Ela faz parte do corporativismo das minorias organizadas, que comandam o país”.
Esta semana, em Goiás, um pai matou o filho a tiros por que não admitia que o filho participasse de manifestações e invasão de escolas; em seguida o pai se matou. Aqui em São Luís, um homem de menos de 40 anos de idade, vivendo uma situação financeira estável, resolveu matar a própria cunhada por motivos até agora obscuros. É essa a esperança e a angústia que perpassa o universo de oportunidades que o brasileiro vive? De que só resta matar e morrer?
Em 2013 o povo, descontente, foi às ruas. Era preciso mudar. O governo eleito estava sendo questionado. O modelo estava sendo questionado por apresentar resultados e contingências que desagradavam os brasileiros. E era um a multidão.
Mangabeira Unger participou dos governos Lula e Dilma como Ministro de Assuntos Estratégicos. Ele viu de dentro a construção e a ruína do governo do PT. “Na nossa realidade, o formato desse enigma foi ter confiado num projeto baseado na massificação do consumo e na produção e exportação de commodities. Enquanto a mineração e a pecuária pagavam as contas, funcionou. Quando deixaram de pagar, ruiu”.
As cadeias estão cheias de criminosos ricos. Esta semana foram presos dois ex-governadores do Rio de janeiro. Todos sabem que os três poderes pagam supersalários, muito, muito acima do teto constitucional. Todos sabem que os mais ricos pagam menos imposto do que a classe média. O desemprego passa dos 11%. E o pacote fiscal do atual governo afeta primeiro justo da classe média.
Não vai ser a polícia, nem o exército, nem a PF nem nenhum governo, ilegítimo ou legítimo que vai controlar a vontade do povo para sempre. O momento é delicado. As brutalidades estão nas telas de TV, de computadores e de aparelhos celulares. Não é hora de jantares elegantes e ternos refinados. É hora de acabar com a pilhagem, com a bandalheira, com o desrespeito institucional e financeiro. É hora de começar a criar um novo Brasil.