sexta-feira, 19 de abril de 2024

STF mantém decisão do TJMA em apreciação de reclamação do Estado

Foto: Sérgio Lima/Poder 360

Em decisão que teve como relator o ministro Celso de Mello, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou seguimento à reclamação do Estado do Maranhão, que sustentava que a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) teria transgredido o enunciado constante da Súmula Vinculante nº 10/STF, ao proferir decisão que restabeleceu, em tutela provisória de urgência, o pagamento, até os 21 anos de idade, de benefício a filho de pensionista do regime próprio de previdência do Estado. O jovem teve o pagamento cessado por parte do Estado quando completou 18 anos.

De acordo com o voto do ministro, para justificar a alegada transgressão ao enunciado, a parte reclamante invocou, em síntese, que o processo de origem envolveu a discussão sobre a perda da qualidade de dependente de pensionista do regime próprio de previdência do Estado do Maranhão.

O Estado sustenta que existe um conflito de normas aplicáveis ao caso. Disse que a lei estadual determina que o filho perderá a qualidade de dependente ao atingir a maioridade civil. A lei federal reconhece a manutenção da qualidade de dependente até os 21 anos.

PAGAMENTO CESSADO – Segundo relatado, a parte reclamante informou que o autor da ação – na origem – era pensionista do Estado do Maranhão. Ao completar os 18 anos teve cessado o pagamento do benefício. Próximo de completar 19 anos, ingressou com ação judicial para reestabelecer o pagamento da pensão por morte até atingir os 21 anos, conforme previsto na lei federal.

Prosseguiu afirmando que a questão chegou ao Tribunal de Justiça através de agravo de instrumento. O recurso foi distribuído à 5ª Câmara Cível do Tribunal. A reclamante entendeu que, no julgamento do mérito do agravo, a Câmara poderia adotar duas providências: ou julgar improcedente o agravo, mediante a aplicação do disposto na legislação estadual, ou instaurar o incidente de arguição de inconstitucionalidade previsto no art. 948 e seguintes do Código de Processo Civil. Alegou que, todavia, o órgão fracionário decidiu afastar a aplicação do dispositivo legal, sem declará-lo inconstitucional.

O entendimento do Estado foi de que a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão violou o artigo 97 da Constituição Federal, que dispõe que somente pelo voto da maioria absoluta do Tribunal será declarada a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

O Ministério Público Federal, em manifestação do subprocurador-geral da República, Wagner Natal Batista, opinou pela improcedência da reclamação do Estado.

INEXISTÊNCIA DE DESRESPEITO – Em exame do pedido formulado pelo Estado, o ministro Celso de Mello assinalou que “o exame dos fundamentos subjacentes à presente causa leva-me a reconhecer a inexistência, na espécie, de situação caracterizadora de desrespeito ao enunciado constante da Súmula Vinculante nº 10/STF”.

O ministro ressaltou que é certo que o Supremo Tribunal Federal, em sua jurisprudência (RE 432.597-AgR/SP e AI 473.019-AgR/SP, ambos relatados pelo Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE), considera “declaratório de inconstitucionalidade o acórdão que – embora sem o explicitar – afasta a incidência da norma ordinária pertinente à lide, para decidi-la sob critérios diversos alegadamente extraídos da Constituição” (RTJ 169/756-757, Rel.Min. SEPÚLVEDA PERTENCE).

Celso de Mello prossegue, esclarecendo que “como se sabe, a inconstitucionalidade de qualquer ato estatal só pode ser declarada pelo voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal ou, onde houver, dos integrantes do respectivo órgão especial, sob pena de absoluta nulidade da decisão emanada do órgão fracionário (Turma, Câmara ou Seção)”.

Após explicar a jusrisprudência do STF, que confirma a exigência constitucional da reserva de plenário, e não obstante as razões expostas, o ministro não vislumbrou na decisão do órgão do TJMA a existência de qualquer juízo, ostensivo ou disfarçado, de inconstitucionalidade do dispositivo normativo indicado pela parte reclamante (Lei Complementar nº 73/2004, do Estado do Maranhão).

O ministro citou trecho das informações prestadas pela Câmara do TJMA, segundo as quais o beneficiário ajuizou agravo de instrumento, requerendo reforma da decisão agravada para restabelecimento do benefício de pensão por morte até que completasse 21 anos de idade, haja vista a cessação automática do benefício com a maioridade civil.

Segundo o relato, no agravo, o rapaz argumentou que a antecipação dos efeitos da tutela tem como desejo atender suas necessidades alimentares e de desenvolvimento profissional.

O Estado do Maranhão, por sua vez, refutou a pretensão recursal, sob o argumento de que não seria possível a extensão do benefício, ante a previsão do inciso II do art. 9º da Lei Complementar nº 73/2004; que o óbito ocorreu em 20.09.2014, quando já estava em vigor a LC 73/2004; que não se aplicam as normas da lei federal, vez que a Constituição Federal previu que os estados membros estabeleçam suas normas próprias sobre previdência social.

Ainda nas informações prestadas pela parte reclamada, consta que, na sessão de julgamento da 5ª Câmara Cível do TJMA, realizada no dia 13 de maio de 2019, o relator, desembargador Raimundo Barros, e os desembargadores Ricardo Duailibe e José de Ribamar Castro, votaram pelo provimento do agravo de instrumento para determinar o restabelecimento imediato do benefício de pensão por morte ao agravante até os 21 anos de idade, em sede de deferimento de tutela provisória de urgência.

O relator informou ao ministro que o acórdão reclamado se harmoniza com o precedente obrigatório do Superior Tribunal de Justiça entabulado no Recurso Especial que tramitou sob o rito de recursos repetitivos nº 1.369.832/SP, no sentido de manutenção do pagamento do benefício até a data limite de 21 anos.

E destaca a tese firmada, segundo a qual, “em nosso entendimento, não há violação ao disposto na Súmula Vinculante nº 10, uma vez que o acórdão tem fundamento em precedente obrigatório (CPC, art. 927, III), razão pela qual entendemos desnecessária a discussão sobre a constitucionalidade da Lei Complementar nº 73/2004 perante o Pleno do Tribunal de Justiça do Maranhão”.

DECISÃO – De volta a sua decisão, o ministro disse que “o exame dos fundamentos que dão suporte ao acórdão ora questionado evidencia que o E. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, ao contrário do que sustentado pela parte reclamante, não realizou exame de constitucionalidade da Lei Complementar maranhense nº 73/2004, o que afastava – por ausente qualquer ato de controle constitucional – a necessidade de observância do postulado da reserva de plenário (CF, art. 97)”.

Em seguida, o ministro reproduziu fragmento do parecer da Procuradoria-Geral da República: “Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem procedeu à interpretação e aplicação do conjunto normativo pertinente ao caso concreto, sem que houvesse qualquer declaração de sua incompatibilidade com a Constituição Federal, conforme se depreende dos excertos abaixo transcritos (fls. 20/22)” (…)

Em outro trecho, cita que “segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, a Súmula Vinculante nº 10/STF não alcança situações jurídicas em que o órgão julgador tenha dirimido o conflito de interesses a partir de interpretação de norma legal. Portanto, não há que se falar, na hipótese dos autos, em ofensa à cláusula de reserva de plenário” (…)

Celso de Mello prossegue dizendo que “impende registrar, bem por isso, que não transgride a autoridade da Súmula Vinculante nº 10/STF o acórdão proferido por órgão fracionário que, sem invocar nas razões conflito entre ato do Poder Público e critérios resultantes do texto constitucional, limita-se a interpretar normas infraconstitucionais”.

Por fim, o ministro destaca um outro aspecto que, “assinalado em sucessivas decisões desta Corte, afasta a possibilidade jurídico-processual de emprego da reclamação, notadamente naqueles casos em que a parte reclamante busca a revisão de certo ato decisório, por entendê-lo incompatível com a jurisprudência do Supremo Tribunal. Refiro-me ao fato de que, considerada a ausência, na espécie, dos pressupostos legitimadores do ajuizamento da reclamação, este remédio constitucional não pode ser utilizado como um (inadmissível) atalho processual destinado a permitir, por razões de caráter meramente pragmático, a submissão imediata do litígio ao exame direto desta Suprema Corte”.

O ministro citou jurisprudência do STF que confirma este entendimento e, em conclusão, disse que “não se acham caracterizadas, na espécie, as situações legitimadoras da utilização do instrumento reclamatório”.

Pelas razões expostas, negou seguimento à reclamação do Estado e determinou o arquivamento dos autos, em decisão tomada em dezembro de 2019.

– Publicidade –

Outros destaques