MC João. Simple assim. Já ouviu falar? Se ainda não, ao menos deve ter escutado a música Baile de Favela, uma das mais executadas do Brasil durante o Ano-Novo e que já atingiu mais de 40 milhões de visualizações no YouTube.
O sucesso repentino foi uma surpresa não só para os fãs de funk, que ainda não conheciam o rapaz de 24 anos que cresceu no distante bairro da Jova Rural, na zona norte de São Paulo .
João também não esperava ver sua música se tornar um hino em festas, bailes e carros equipados com som potente na periferia. Para ele, atingir só um milhão de visualizações era uma meta pra lá de satisfatória quando largou o trabalho e assinou contrato com a produtora GR6.
No funk, manter essa média de acessos no YouTube a cada música lançada não deixa o MC rico. Mas já ajuda a lucrar mais que qualquer vaga com carteira assinada pode remunerar quem não teve acesso ao ensino superior ou técnico.
E esse é o caso de João. Durante sete anos, ele adiou o sonho de ser uma estrela no funk para sustentar a mãe e as duas irmãs. Antes de se dedicar integralmente ao funk, ele trabalhou como office boy e ganhava um salário mínimo por mês.
Magicamente, pagava as contas, o aluguel, colocava comida na mesa e ainda investia o que sobrava para pagar as produções das músicas. Hoje, a situação é diferente. Mas João não se ilude. Ele sabe que o sucesso no funk é efêmero e o astro de hoje, pode ser um mero desconhecido amanhã.
— Sustentar a casa com aquilo era um milagre. R$ 200 de aluguel, contas e a comida. Tive que fazer bicos, rifa e ainda ganhava um pouco com funk para completar a renda. Mas to de boas. No funk as coisas acontecem muito rápido. Hoje eu to bombado, mas daqui seis meses não dá para saber.
Então, nada de sonhar em ter carrões, correntes de ouro e outros itens que compõem o tradicional kit ostentação dos músicos do gênero. Para ele, é melhor ter o pé no chão.
— Desde junho de 2015, minha vida mudou e eu agora tenho um pouco mais de conforto. Não sou chegado a luxo. Ostentação não é coisa de funkeiro. A mídia que influencia o consumismo. Os filmes norte-americanos fazem isso com a gente. E aí a molecada tem vontade mesmo de ter as coisas. Eu só queria poder ir a um restaurante e comer as coisas sem receio. Eu penso em melhorar de vida, comprar apartamento, mas carreira de funkeiro é muito ingrata. Tem que ficar esperto. Pelo menos agora eu não como só mais carne moída e salsicha, tem sobrado grana para a alcatra.
É por ter essa consciência e até um certo desapego com bens materiais, que João ainda não gastou quase nada do pouco que ganhou até aqui com o seu primeiro sucesso. Nesses últimos três meses, o cachê do MC pulou de R$ 2 mil por show para R$ 10 mil. O valor é irrisório, se comparado ao que ganha um sertanejo com a mesma visibilidade na internet. Mas ainda assim é mais grana que ele já viu em toda a vida.
— Prefiro reformar minha casa do que comprar um carro de R$ 100 mil. Melhor ter um carro popular. Não é porque sou MC que preciso ostentar. Nem gosto de correntona. Nem manjo muito de carro, se for te falar a verdade. Se eu sair na rua, só sei qual é a Santa Fé. Juro pra você.
Mas no clipe de Baile de Favela, os carrões estão lá. Gravado na Rua 7, no bairro onde João cresceu, o vídeo tem a assinatura de KondZilla, diretor mais requisitado do funk paulista. Com a presença de três mil moradores da região, o vídeo é simples, mas efetivo para o que se propõe: celebrar o legítimo baile de favela — ou o fluxo (festa de rua com som alto, danças e bebida).
— Lá é o baile de favela original. Agora eu passo na rua, vou pra praia e a galera tá ouvindo a música. Maior satisfação.
O sucesso desse funk, que tem jeito de hino, vai dar nome a uma festa itinerante que será realizada pela produtora do cantor, a GR6. Segundo o produtor Juninho Love, o baile vai reunir inúmeros MCs e passará por casas de shows de São Paulo e também de outros estados, já que a música bombou em lugares como o Rio, que antes era inacessível para o funk paulista.
— Não adianta reclamar que não tem espaço para o funk. Se não tem, a gente cria. O funk ainda é muito desvalorizado. Infelizmente, quando um sertanejo atinge o nível do João, ganha cachê de R$ 100 mil e nosso segmento ainda não tem como exigir isso. Mas estamos crescendo.
João comemora não só isso, mas também o fato da música ter sido cantada e compartilhada por astros da música e jogadores de futebol, como Guilherme Arana, do Corinthians. O lateral do clube paulista gravou um vídeo com a mãe cantando Baile de Favela durante uma festa familiar. Apesar dessa aceitação, o MC fala que muita gente critica a letra e diz que ela soa machista.
— Não tenho essa intenção. Eu namoro, sou fiel e respeito muito as mulheres. Tenho três lá em casa, né? A galera tem que se preocupar com o que é urgente. Perto dos problemas do Brasil, Baile de Favela não é nada.