Conversar com os amigos em um grupo do Whatsapp, fazer uma chamada de vídeo com aquele parente que mora longe e pagar contas pelo aplicativo do banco no celular: se você acha que tudo isso é coisa de gente jovem, está na hora de rever os seus conceitos. De acordo com Maisa Kairalla, médica geriatra e presidente da SBGG-SP (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Estado de São Paulo), a inclusão digital na terceira idade, mais que necessária, é positiva para a saúde da população com mais de 60 anos.
— O acesso aos dispositivos digitais estimula o cérebro e, nesse sentido, os ganhos cognitivos são vários. Há pesquisas que mostram benefícios para aspectos como memória e até depressão, que nós observamos muito no consultório. Na internet, o idoso interage e socializa mais. Isso faz bem para o comportamento dele, já que ele fica mais ativo e se integra à realidade de hoje, em que boa parte da rotina envolve tecnologia.
No Brasil, cada vez aumenta o número de pessoas acima de 50 anos envolvidos com as novas tecnologias. Segundo pesquisa divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2016, 14,9% da população idosa brasileira utiliza a internet — dez anos atrás, os usuários eram apenas 7,3%. O número de idosos ndessa faixa etária que utiliza o celular também aumentou bastante: pulou de 16,8% em 2005 para 55,6% nos dias de hoje.
Camilla Vilela, gerontóloga da Cora Residencial Senior — instituição de longa permanência para idosos da capital paulista —, concorda que os dispositivos trouxeram autonomia para os idosos que, muitas vezes, não gostam de ter que pedir ajuda para realizar tarefas do dia a dia. Os benefícios, segundo a profissional, se estendem para as capacidades motoras e visuais de quem tem mais de 60 anos.
— Só o fato de aprender algo novo, independentemente de ser no computador ou celular, já é um estímulo cognitivo para eles. Fora isso, a interação com os dispositivos tecnológicos acaba trabalhando estimulação motora, percepção visual, memória, atenção e processamento de informações.
Para o aposentado Geraldo Rocco, de 80 anos, o contato com a tecnologia garantiu a independência de poder pagar as próprias contas sem sair de casa — o deslocamento seria complicado, já que Rocco se locomove por cadeira de rodas. Ele conta que começou a transição do mundo analógico para o digital há pouco mais de 25 anos, quando os calhamaços do departamento de compras da multinacional onde trabalhava foram substituídos por computadores. Aos poucos, a rotina de interação com os aparelhos foi incorporada à vida pessoal.
— Hoje, eu faço qualquer transação pelo site do banco. A vida ficou muito mais fácil. Meu celular, por enquanto, não é smartphone, mas eu pretendo trocá-lo em breve para falar com meus filhos pelo Whatsapp.
Qualidade de vida e combate à solidão: As novas possibilidades de interação com amigos e familiares, aliás, representam um dos grandes impactos positivos que o contato com tablets, smartphones e computadores podem trazer para os idosos. Isso porque na terceira idade as tendências ao isolamento aumentam, segundo a psicóloga Blenda de Oliveira, da SBP-SP (Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo).
— Esse isolamento acontece depois dos 60 anos por vários motivos. Às vezes por limitação física, por abandono da família ou porque os parentes e amigos moram longe. O problema é que essa solidão, muitas vezes, faz com que eles percam as trocas com o mundo e até leva a doenças como depressão. O bom da tecnologia é que ela funciona como uma ferramenta eficiente de interação.
O aposentado Julio Miskolci, de 81 anos, por exemplo, faz chamadas de vídeo todos os dias para conversar com o filho, que mora no Catar. É um ritual quase religioso: às 13h em ponto, ele liga o tablet e aguarda a ligação. Também acessa o e-mail para ver fotos de parentes e bate-papo com os netos. “Comecei a mexer há alguns anos. Meu filho deu algumas dicas e eu fui seguindo”, conta.
A psicóloga da SBP-SP ressalta que os idosos que cultivam o contato com outras pessoas — na internet e fora dela — têm uma qualidade de vida muito maior, com mais alegria e menos queixas do ponto de vista psicológico. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam que 11,1% da população brasileira com mais 60 anos se declara depressiva. As profissionais entrevistadas completam que a busca pela qualidade de vida é importante especialmente no caso desses indivíduos que sofrem de depressão e outras doenças crônicas — que não têm cura —, como diabetes, hipertensão, Alzheimer e mal de Parkinson.
O que não pode acontecer, de acordo com Blenda, é o exagero: “É sempre bom observar a forma como essas tecnologias são utilizadas. Elas não devem substituir o contato presencial com as pessoas e a atividade física, por exemplo. Caso contrário, a tecnologia pode levar a um outro tipo de isolamento, igualmente preocupante”, completa.