sábado, 21 de dezembro de 2024

Gravidez na adolescência tem riscos psicológicos e sociais

A cada ano, mais de 500 mil meninas entre 10 e 19 anos têm filhos no Brasil. Esse número já foi maior: em 2004, eram cerca de 660 mil, de acordo com o Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc).

Essa redução está relacionada a vários fatores, como expansão de políticas públicas e mais acesso a métodos contraceptivos, e pode ser considerada um avanço, pois a gravidez precoce tem impacto diferenciado no corpo e na vida da jovem, assim como das crianças.

Segundo a especialista em hebiatria (ramo da medicina voltado para a saúde de adolescentes) Denise Ocampos, estudos mostram que uma gravidez que ocorre nos dois anos seguintes após a primeira menstruação oferecem mais risco para mãe e bebê, pois o organismo da menina ainda está se adaptando às mudanças hormonais e ao crescimento dos órgãos. Após esse período, segundo a especialista, o risco é o mesmo enfrentado por qualquer mulher que está em sua primeira gestação, independentemente da idade.

“Os riscos maiores são psicossociais”, afirma Denise Ocampos. Como, normalmente, a gravidez na adolescência não é planejada e intencional, a vida escolar e a atuação futura no mercado de trabalho da mãe podem ser afetadas. “A menina também pode ter problemas familiares, pois há famílias que não aceitam a gravidez na adolescência”, alerta a especialista.

A pausa nos estudos foi um dos principais impactos da gravidez na vida da auxiliar de serviços gerais Erica Soares, de 22 anos. Quando engravidou, aos 18, a moradora da Cidade Estrutural (DF) não viu outra saída senão interromper a vida escolar. “Eu não queria deixar minha filha com qualquer pessoa, achava que ela dependia muito de mim. Na época, eu estava 2º ano do Ensino Médio”, conta a jovem.

A pequena Ester Santos está prestes a completar 5 anos de idade, mas Érica não se esquece da dificuldade que teve para cuidar da garota nos primeiros meses de vida. “Eu não tinha experiência, então minha mãe me ajudava com tudo: cuidar, dar banho, alimentar. A presença dela foi muito importante. Talvez eu tivesse conseguido [cuidar da Ester] sem a ajuda dela, mas com certeza seria muito mais difícil”, conta Érica.

A gravidez na adolescência constitui uma situação delicada e exige cuidados específicos. Denise explica que tudo depende do contexto em que a menina grávida está inserida. Assim como ocorreu no caso de Érica, Ester e família, problemas como depressão pós-parto, abandono, negligência e maus tratos, além de serem riscos inerentes a qualquer gestação, podem ser minimizados com uma rede de apoio presente. “Se essa adolescente tiver apoio familiar, decidir cuidar da criança e tiver amor, cuidado e afeto, esse bebê vai crescer bem”, pontua a especialista.

Segundo Denise, é comum a adolescente ter uma “negação” com relação à criança e confiar a terceiros a responsabilidade pelo cuidado e pela criação. “Ela pode entender que a maternidade vai atrapalhar a vida dela, pode sofrer com questões relacionadas ao próprio desenvolvimento psicológico, questionar por que isso aconteceu com ela, ter depressão e baixa autoestima, por exemplo”, explica.

“A família deve apoiar essa adolescente, ir ao pré-natal junto com ela, acompanhá-la em todos os momentos, não rejeitá-la, não brigar, não abandonar, não expulsar de casa, como muitas famílias fazem, não fazer com que ela saia da escola ou abandone o trabalho”, enfatiza Denise. De acordo com a especialista, se a família tiver essa conduta, a adolescente vai continuar a estudar, trabalhar e dar prosseguimento ao seu projeto de vida.

Apesar de não ser casada com o pai de Ester, Érica conta que o rapaz é um pai presente, que sempre “ajuda no que precisa” e pelo qual a menina sente um apego muito forte. “Se eu pudesse voltar no tempo, não teria engravidado com aquela idade, mas está dando tudo certo, com o apoio da família. O pai da Ester sempre foi presente. É claro que, sem ele, eu conseguiria criá-la da mesma forma, mas, sentimentalmente, é muito importante para ela que ele esteja por perto”, afirma.

Violência sexual

“Nós [profissionais de saúde] temos que nos preocupar com a violência sexual, muito inerente à questão da gravidez na adolescência. A primeira coisa que temos que perguntar é se houve violência, se a atividade sexual foi ou não consentida”, destaca Denise. Ela lembra que manter relações sexuais com crianças e adolescentes abaixo dos 14 anos é uma prática caracterizada pela lei como estupro de vulnerável e afirma que a gravidez decorrente de violência sexual é subdiagnosticada.

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