Assisti (11/03/2025), no Centro Cultural do Ministério Público do Maranhão, ao Bate-papo musical da Dra. Selma Martins sobre letras de conteúdo agressivo contra a mulher.
Promotora de Justiça Especializada na Defesa da Mulher, Dra. Selma tem feito essa apresentação com a finalidade de despertar as pessoas para o fato de que, cantarolando aquelas músicas, estão propagando a violência.
Sua metodologia é simples, descontraída e eficaz. Anuncia a música e logo vê a alegria na plateia, de onde alguém anuncia: – Conheço essa! Mas logo Dra. Selma exibe a letra da melodia e a expressão é outra: – Vixe!!! Não canto mais.
A eficácia do método está no fato de que as pessoas conhecem as músicas, cantam suas letras, mas não se dão conta da gravidade do conteúdo, até quando, naquele momento, são confrontadas com o teor de ofensa e desrespeito dos quais são involuntárias propagadoras.
É relevante destacar que a Promotora não pugna pela censura. Ao contrário. Usa exatamente as letras das músicas ofensivas à dignidade das mulheres para alertá-las. E o faz como se as estivesse colocando diante de um espelho para se verem cantando músicas e prestigiando autores que as fazem denegrir a si mesmas. A advertência se dirige aos homens, também, pois são eles os personagens agressores retratados nas letras cantadas e aplaudidas até histericamente:
- Se te agarro com outro te mato, Te mando algumas flores e depois escapo;
- Eu só sei que a mulher que engana o homem merece ser presa na colônia, orelha cortada, cabeça raspada, carregando pedra pra passar vergonha;
- Todo homem que sabe o que quer, pega o pau pra bater na mulher;
- Sempre de cara amarrada, será que ela quer pancada?;
- Tirei sem pensar o cinto, E bati até cansar;
- Então eu vou te cortar a cabeça, Maria Chiquinha;
- Vou dar um castigo nela, Dá-lhe uma banda de frente, Quebrar cinco dentes e quatro costelas.
No percurso da apresentação, a tragédia de Lindomar Castilho, autor de Você é doida demais e do assassinato de Eliane Grammont, sua ex-mulher. E, no final, a reação, na voz de Alcione:
- Comigo não, violão, Na cara que mamãe beijou Zé ruela nenhum bota a mão. Se tentar me bater, Vai se arrepender.
Contudo, compositores e escritores não são responsáveis pelos atos de terceiros. Se assim não fosse, Goethe (Os Sofrimentos do Jovem Werther, 1774), Sampaio (Palavras Cínicas, 1905), Salinger (O Apanhador no Campo de Centeio, 1951), Beckett (Final de Jogo, 1957) e Lispector (Água Viva, 1973), dentre outros, teriam respondido pelos efeitos deletérios de que são acusados, pelo que escreveram.
O que a Dra. Selma faz é parte da incumbência que o art. 127 da Constituição da República atribui ao Ministério Público: defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Para isso, é preciso não se limitar às atividades processuais, mas ir além, dedicando-se, também, à tarefa preventiva, informativa, educativa de que carece a comunidade, em contraponto ao desmonte moral do qual tem sido alvo.
* Advogado e jornalista