Há poucos dias fui ao TRE-MA e, ao sair, encontrei um cidadão no local onde estacionei o carro. Cumprimentei-o. Morador de um casebre à beira da Vala da Macaúba, conversamos sobre a situação calamitosa da vala, entulhada de lixo, lama e fétida. Ele foi objetivo: – Essa vala é assim o tempo todo. Se limparem, não terão mais o que prometer nas eleições seguintes.
São fatos consumados o cinismo e a hipocrisia dos candidatos. Realidade imutável no Legislativo e no Executivo. No Judiciário não há esse tipo de promessa, mas ministros da Suprema Corte estão mostrando como é possível suprimir a dignidade, o respeito e a credibilidade da Instituição.
Assiste-se a uma espécie de autofagia moral teatralizada com emblemáticos desfiles de quirópteros incapazes de puxar a própria cadeira para sentar-se, certamente pela quadratura das rodinhas das requintadas poltronas. Precisam de quirópteros de asas curtas para fazê-lo.
A última afronta à paciência das pessoas de bem é a patacoada sobre a prisão após decisão condenatória em Segunda Instância. Também sou contra, mas não se trata de questão shakespeariana e sim de coerência, de respeito, de moralidade.
A questão tem sido decidida de acordo com conveniências alheias ao Direito e à Justiça. A norma que antepõem à prisão é o inciso LVII do art. 5º da CF, que não trata de prisão, mas de culpabilidade: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Se esse dispositivo trata da impossibilidade de prisão, como explicar a prisão provisória, decretada antes da ação penal? E a preventiva, antes ou no curso do processo, “como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria” (Art. 312 do CPP)?
Ademais, a prisão após a condenação em Segunda Instância não é automática, mas a critério do Tribunal. Logo, trata-se de um debate inútil, senão para cabotinismos cínicos porque o julgador poderá aplicar a norma do art. 312 do CPP, se o condenado, por exemplo, perturbar a ordem pública.
Se houvesse honesta ignorância sobre o tema, a questão seria: por que um condenado em Segunda Instância não pode ter sua prisão decretada, em razão do risco que oferece sua liberdade, e aquele que sequer teve um julgamento permanece anos presos – e há centenas, senão milhares nas penitenciárias brasileiras nessa situação – preventivamente? Balela.
Se a alegação é de princípio constitucional, há um que precede ao do trânsito em julgado, qual seja o da igualdade, permanentemente desrespeitado, com inúmeros casos de pessoas humildes, injusta e ilegalmente jogadas em celas superlotadas, sem qualquer higiene ou resquício de humanidade, à espera de um julgamento na Suprema Corte e por esta totalmente ignoradas.
Trata-se de acintosa farsa para beneficiar comparsas. Não importa se isso causará um desastre na segurança pública e na economia, porque a fortuna apreendida terá de ser devolvida aos corruptos que saquearam os cofres públicos.
É lamentável. Já não se trata apenas de insegurança jurídica, mas da demolição de um Poder que deveria ser o depositário da última esperança dos injustiçados.
*Advogado. Mestre em Direito Econômico e Político (Mackenzie SP) carlos.nina@yahoo.com.br